Decretação de falência leva à extinção de execuções suspensas durante a recuperação judicial
A certeza quanto à irreversibilidade da decisão que decretou a falência de uma empresa devedora permite que as ações de execução movidas contra ela, suspensas em razão do processo de recuperação judicial, sejam extintas.
Dessa forma, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão do juízo de origem que extinguiu ações movidas pela Petrobras Distribuidora contra um posto de combustível e que estavam suspensas em razão da recuperação.
No recurso rejeitado pelo STJ, a Petrobras Distribuidora alegou que os artigos 6º e 99 da Lei de Falência e Recuperação preconizam a suspensão dessas demandas, e não a extinção, como foi determinado pelo juízo competente.
Para a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial, a suspensão das execuções é determinação expressa em lei, mas, apesar desse fato, a extinção, nos limites propostos no voto, não se revela incompatível com o ordenamento jurídico.
“Não se está propondo que tais processos devam ser extintos ab initio, ao invés de serem suspensos. O que se defende é que, após a formação de juízo de certeza acerca da irreversibilidade da decisão que decretou a quebra, não há sentido prático em manter as execuções individuais suspensas, ante a impossibilidade de seu sucesso”, fundamentou a relatora.
Medida inócua
De acordo com a ministra, a eventual retomada das execuções individuais suspensas se traduz em medida inócua, por serem pretensões carentes de possibilidades reais de êxito.
“Na hipótese de ter havido o pagamento integral dos créditos, a pretensão executiva individual estaria satisfeita, o que ensejaria sua extinção. Já na segunda hipótese, a insuficiência do produto do ativo realizado conduziria, inexoravelmente, à inviabilidade prática do prosseguimento das execuções suspensas, à vista do exaurimento dos recursos aptos a satisfazer as obrigações respectivas”, disse a relatora.
A ministra lembrou que a decretação da falência acarreta a extinção da pessoa jurídica da sociedade empresária, derivada de sua dissolução total, significando que mesmo que fosse possível retomar a execução, “tais pretensões careceriam, em última instância, de pressuposto básico de admissibilidade apto a viabilizar a tutela jurisdicional, ante a inexistência do sujeito passivo contra o qual exigir o cumprimento da obrigação”.
Leia o acórdão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1564021
COMENTÁRIOS: Embora não vejamos prejuízos práticos à parte, não conseguimos concordar com as conclusões do referido julgado, uma vez que, como ressaltado no próprio teor do acórdão, a lei fala apenas em suspensão das ações e não em extinção.
Outrossim, a decretação da falência tem o condão de dar início ao processo de dissolução das sociedades, isto é, a decretação da falência é o marco inicial da extinção da sociedade.
A dissolução lato sensu é o processo de encerramento da sociedade que objetiva a extinção da pessoa jurídica. Esse processo deve ter um marco inicial, isto é, deve ocorrer um fato para desencadear todo o processo. Esse fato é o que denominamos dissolução stricto sensu, que pode ser entendido como a causa do encerramento da sociedade. Nesse momento, opera-se uma alteração no objetivo da sociedade. Em vez de objetivar a produção dos lucros, a sociedade passa a objetivar o acerto de sua situação patrimonial.
No caso das sociedades empresárias (CC – arts. 1.044, 1.051 e 1.087; Lei n. 6.404/76 – art. 206, II, c), qualquer que seja a forma adotada, a falência representa esse marco inicial do processo de dissolução. A ausência de patrimônio suficiente para honrar o pagamento de todos os credores da companhia é um traço normalmente ligado à falência e, por isso, o fim do processo de falência leva ao fim do patrimônio social e, consequentemente, à inexequibilidade de qualquer objetivo a que se tenha proposto a sociedade. Por isso, com a decretação da falência, inicia-se o processo de dissolução da sociedade.
Dentro dessa perspectiva, faz-se necessária a liquidação do patrimônio da sociedade falida, o que ocorrerá por meio de um procedimento especial previsto na Lei n. 11.101/2005. Nessa liquidação, será apurado o ativo da sociedade falida e pago o passivo. Finda a liquidação, encerra-se o processo de falência.
Encerrado o processo de falência, Sérgio Campinho entende que a sociedade poderá ser extinta com a devida baixa no registro[1]. Ousamos discordar desse entendimento. A nosso ver, a baixa só será possível com a extinção das obrigações do falido[2].
A extinção do processo de falência não significa a extinção das obrigações do falido, as quais só serão extintas nos casos previstos no art. 158 da Lei n. 11.101/2005. Embora a existência de ações em curso não seja um óbice à extinção das sociedades, a presença de obrigações não solvidas ao fim do processo de falência impede essa extinção. Apenas com a extinção das obrigações é que acreditamos ser possível a extinção da sociedade falida. Prova disso é a necessidade de comunicação dessa extinção a todas as pessoas comunicadas da falência. Ora, se a sociedade já houvesse sido extinta, não haveria necessidade de comunicação. Ademais, os anexos da Instrução Normativa n. 10/2013 do Departamento de Registro Empresarial e Inovação – DREI que tratam da sociedade limitada e da sociedade anônima preveem o arquivamento da notícia da extinção das obrigações.
Nos casos em que todos os credores são pagos ou mesmo nos casos de extinção das obrigações, previstos pelo art. 158 da Lei n. 11.101/2005, nada impede que seja feita a opção pela saída do processo de dissolução e o retorno às atividades normais.
[1] CAMPINHO, Sérgio. Falência e recuperação de empresa: o novo regime de insolvência empresarial. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 439.
[2] STJ – REsp 883.802/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27-4-2010, DJe 12-5-2010.