Em decisão inédita, 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás entendeu que a deliberação de assembleia de credores de empresa em recuperação judicial deve prevalecer perante aos demais credores. No caso, decidiu-se que a supressão de garantias reais e fidejussórias aprovada pela assembleia geral atinge todos os credores, mesmo aqueles que não concordaram. Veja a integra da decisão aqui.
Um limite imposto ao plano de recuperação judicial refere-se às garantias reais oferecidas pelo devedor. Estabelece a Lei n. 11.101/2005 (art. 50, § 1º) que “na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia”.
O dispositivo tem a redação um tanto quanto confusa, mas a doutrina tem-se esforçado para chegar ao alcance de tal regra. Rachel Sztajn e Silva Pacheco afirmam que a intenção do dispositivo é evitar qualquer alteração na garantia real sem o consentimento do credor[1]. De modo similar, Sérgio Campinho afirma que a lei “condiciona à expressa aprovação de credor a alienação do bem objeto de garantia real ou a substituição da garantia”[2].
De outro lado, Fábio Ulhoa Coelho afirma que tal restrição deve ser entendida da seguinte forma:
Para a simples supressão ou substituição de uma garantia real, é suficiente que o plano de recuperação judicial seja aprovado. Mesmo que o titular da garantia não tenha votado em favor do plano, sua aprovação basta para a supressão ou substituição. Se, porém, for prevista a alienação do bem como meio de recuperação judicial, será indispensável a concordância do credor titular da garantia[3].
A nosso ver, a razão está com o último autor, pois o dispositivo limita-se à hipótese de alienação do bem dado em garantia, como se depreende do início da sua formulação, que diz: “Na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia.” Assim, a simples desoneração ou substituição da garantia não depende do consentimento do credor titular da garantia. Nesse sentido, já decidiu o STJ que
[…] a supressão das garantias real e fidejussórias restou estampada expressamente no plano de recuperação judicial, que contou com a aprovação dos credores devidamente representados pelas respectivas classes (providência, portanto, que converge, numa ponderação de valores, com os interesses destes majoritariamente), o que importa, reflexamente, na observância do § 1º do art. 50 da Lei n. 11.101/2005, e, principalmente, na vinculação de todos os credores, indistintamente[4].
Da mesma forma, a simples alienação do bem objeto da garantia, sem afastar o direito real, não dependerá do consentimento do titular da garantia. Todavia, a alienação do bem, afastando-se a garantia que incide sobre ele, seja pela substituição, seja pela simples desoneração, dependerá do consentimento específico do credor titular da garantia.
[1] SZTAJN, Rachel. In: SOUZA JÚNIOR, Francisco Sátiro de; PITOMBO, Antônio Sérgio de A. de Moraes (Coord.). Comentários à lei de recuperação de empresas e falência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 267; PACHECO, José da Silva. Processo de recuperação judicial, extrajudicial e falência. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 162.
[2] CAMPINHO, Sérgio. Falência e recuperação de empresa: o novo regime de insolvência empresarial. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 150.
[3] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, v. 3, p. 420-421.
[4] STJ – REsp 1532943/MT, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 13-9-2016, DJe 10-10-2016.