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Processo 1084733-43.2018.8.26.0100
Decisão
Vistos. 1 – Trata-se de pedido de recuperação judicial formulado por (I) ATIVIC S.A. inscrita no CNPJ/MF sob n.º 02.291.096/0001-10, (II) ABRILPAR PARTICIPAÇÕES LTDA., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 03.555.186/0001- 33, (III) ABRIL MÍDIA S.A., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 02.190.223/0001-94, (IV) ABRIL COMUNICAÇÕES S.A., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 44.597.052/0001-62, (V) ABRIL MARCAS LTDA., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 02.007.586/0001-41, (VI) CANAIS ABRIL DE TELEVISÃO LTDA., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 04.946.947/0001-40, (VII) ABRIL RADIODIFUSÃO S.A., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 03.555.171/001-75, (VIII) IBA COMERCIAL E DISTRIBUIÇÃO S.A., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 14.457.336/0001-92, (IX) ABRIL TECNOLOGIA DIGITAL S.A., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 03.788.706/0001-58, (X) ABRIL VÍDEO DISTRIBUIÇÃO LTDA., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 23.022.809/0001-10, (XI) ABRIL MUSICLUB LTDA, inscrita no CNPJ/MF sob n.º 02.196.345.0001-98, (XII) USINA DO SOM BRASIL LTDA, inscrita no CNPJ/MF sob n.º 03.555.181/0001-00, (XIII) EDITORA NOVO CONTINENTE S.A., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 62.094.669/0001-47, (XIV) WEBCO INTERNET S.A., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 09.312.286/0001-15, (XV) BEIGETREE PARTICIPAÇÕES LTDA., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 04.946.972/0001-24, (XVI) TV CONDOR S.A., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 02.190.235/0001-19, (XVII) DIPAR PARTICIPAÇÕES LTDA., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 63.990.964/0001-44, (XVIII) DGB PARTICIPAÇÕES – DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DO BRASIL S.A., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 03.555.201/0001-43, (XIX) TEX COURIER S.A., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 73.939.449/0001-93, (XX) DILOGPAR – DISTRIBUIÇÃO, LOGÍSTICA E PARTICIPAÇÕES LTDA., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 74.446.592/0001-06, (XXI) DINAP – DISTRIBUIDORA NACIONAL DE PUBLICAÇÕES LTDA., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 03.555.225/0001-00, (XXII) TREELOG S.A. – LOGÍSTICA E DISTRIBUIÇÃO, inscrita no CNPJ/MF sob n.º 61.438.248/0001-23, (XXIII) CASA COR PROMOÇÕES E COMERCIAL LTDA., inscrita no CNPJ/MF sob n.º 60.292.703/0001-62, todas com principal estabelecimento na Avenida Major Sylvio de Magalhães Padilha, n.º 5.200, conjunto 1, bloco A, Jardim Morumbi, São Paulo-SP, CEP 05693- 000. As requerentes alegam, como causas da crise, a queda expressiva das receitas de publicidade e daquelas provenientes das vendas por assinatura e nas bancas, que impactaram negativamente no modelo de negócios das empresas de comunicação de publicações impressas. Relatam que os esforços da administração para a reestruturação do GRUPO ABRIL, com redução do quadro de funcionários e o encerramento da publicação de vários títulos, resultaram em despesas que impactaram negativamente no fluxo de caixa das empresas, reduzindo seu capital de giro. Além disso, as instituições financeiras deixaram de abrir novas linhas de crédito e passaram a reter valores essenciais para a continuidade das operações, tornando inevitável o recurso à recuperação judicial. 2 – Desnecessária qualquer análise prévia, de natureza pericial, para o deferimento do pedido de recuperação judicial. O artigo 52 da Lei n. 11.101/2005 dispõe que, estando em termos a documentação exigida no artigo 51, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial. A análise da documentação elencada no artigo 51 cabe ao juiz que preside o processo de recuperação, e não ao administrador judicial. O juiz não fará um mero check list da presença de todos documentos, mas um juízo de cognição sumária dos fatos, para o que, entende-se, tem plenas condições, na maioria dos casos, mesmo sem o auxílio de um perito. No julgamento do Agravo de Instrumento n. 2184085-34.2016.8.26.0000 destacou o Tribunal de Justiça de São Paulo que, ainda que por vezes o magistrado não detenha conhecimentos técnicos suficientes para apreciar a regularidade da documentação contábil apresentada, é preciso evidências de elementos contundentes a apontar a inviabilidade da recuperação ou a utilização abusiva da benesse legal, a justificar o risco de eventual paralisação da atividade empresarial até que a perícia se realize e seja deferido o processamento da recuperação. No caso dos autos, a postergação do exame dos requisitos legais seria perniciosa à continuidade da atividade das recuperandas, além de gerar um custo adicional ao desenvolvimento regular do processo. E diante das informações contidas na petição inicial e dos documentos juntados pelas requerentes, estão presentes os requisitos dos arts. 48 e 51 da Lei 11.101/2005, suficientes para o deferimento do processamento da recuperação judicial neste juízo. Ao menos em um exame preliminar, a atividade econômica das requerentes está em crise, as sociedades atuam de forma complementar, há administração centralizada e identidade de acionistas e sócios, tudo a justificar a tramitação dos pedidos de recuperação judicial de forma conjunta, em um único processo, com economia de despesas e esforços. 3 – Pelo exposto, defiro o processamento da recuperação judicial das sociedades mencionadas no item 1 e nomeio como administradora judicial Deloitte Touche Tohmatsu Consultores Ltda., CNPJ 02.189.924/0001-03, representada por Luis Vasco Elias, CPF 073.762.938-09, com endereço na Avenida Doutor Chucri Zaidan, 1240, Golden Tower – 4º ao 12º andares – CEP 04711-130 – São Paulo, SP, telefones (11) 5186-1863 e (11) 5186-1853 e endereço eletrônico ajcomunicacao@deloitte.com, que, em 48 horas, juntará nestes autos digitais o termo de compromisso devidamente subscrito. 3.1 – Isso não significa, porém, o deferimento automático da consolidação substancial, com a aglutinação dos ativos das devedoras para pagamento dos seus credores, a apresentação de um plano unitário e a votação do referido plano em única deliberação. Deverão as requerentes, na apresentação do plano de recuperação, na forma do art. 53, demonstrar a necessidade da consolidação substancial e os benefícios que esta medida poderá trazer, o que será objeto da análise do Administrador Judicial e poderá suscitar objeção por parte dos credores. Cada credor poderá sustentar que negociou com determinada sociedade exclusivamente em razão de seu patrimônio, sem considerá-la integrante do grupo, demonstrando que a consolidação poderá prejudicá-lo. O juízo decidirá, então, se a consolidação será a medida adequada ou se caberá aos credores deliberar a respeito em assembleia. 3.2 Diante do exposto acima, apresentem as recuperandas listas de credores de cada sociedade que ocupa o polo ativo, bem como relatório de fluxo de caixa referente a cada recuperanda. 4 – Suspendo as ações e execuções contra as recuperandas pelo prazo de 180 dias, e também o curso dos respectivos prazos prescricionais, permanecendo os autos nos juízos onde se processam, ressalvadas as disposições dos §§ 1º, 2º e 7º do artigo 6º e §§ 3º e 4º do artigo 49 e inciso III do artigo 52 da Lei 11.101/2005. Caberá às recuperandas a comunicação da suspensão aos juízos competentes. 4.1 Pedem as recuperandas seja observado, na forma disposta no art. 49, §3º, da LRF, a vedação da venda ou retirada de bens essenciais às suas atividades, inclusive de direitos creditórios (recebíveis), essenciais à manutenção de suas atividades operacionais; e também a inadmissibilidade da amortização de créditos mediante a utilização de valores provenientes de garantias (rotuladas de cessão fiduciária) que não tenham sido descritas e individualizadas e regularmente registradas nos cartórios competentes, conforme o disposto na Lei n.º 10.931/04 e Súmula 60 do E. TJ-SP. Ocorre que, ao menos por ora, não há elementos probatórios nos autos indicativos de que as cessões fiduciárias não tenham sido regularmente constituídas, e, relativamente à essencialidade dos recebíveis, é necessária a prévia demonstração de qual o montante dos recebíveis é essencial, ou seja, destinado a pagar seus funcionários, prestadores de serviços, tributos e insumos, permitindo a continuidade das atividades. 5 – Determino às recuperandas apresentação de contas até o dia 30 de cada mês, sob pena de afastamento dos seus controladores e substituição dos seus administradores. Todas as contas mensais deverão ser protocoladas diretamente nos autos principais. Sem prejuízo, às recuperandas caberá entregar mensalmente ao administrador judicial os documentos por ele solicitados e, ainda, extratos de movimentação de todas as suas contas bancárias e documentos de recolhimento de impostos e encargos sociais, bem como demais verbas trabalhistas a fim de que possam ser fiscalizadas as atividades de forma adequada e verificada eventual ocorrência de hipótese prevista no art. 64 da LRF. 6 – Dispenso as recuperandas de apresentação de certidões negativas para que exerçam suas atividades, ressalvadas as exceções legais. Porém, devo registrar o posicionamento adotado em relação à exigência prevista no art. 57 da LRF, quanto à prova de regularidade fiscal para a concessão da recuperação judicial. A falta de apresentação de certidão negativa de débito tributário não era considerada óbice para a concessão da recuperação, enquanto não editada a lei específica a disciplinar o parcelamento da dívida fiscal e previdenciária, prevista no art. 68 da LRF (REsp. 1.187.404/MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial). A legislação editada que previu o parcelamento dos tributos federais para empresas em recuperação impediu o acesso a tal benefício pelos devedores que não renunciaram às suas pretensões judiciais (art. 10, par. 2º., da Lei 10.522, com a redação conferida pela Lei 13.043/2014), além de ter estabelecido condições mais gravosas do que as previstas em outras normas, como o prazo de 84 meses, e não de 180 ou 240 meses em outros regimes de parcelamento. Ademais, nos termos do art. 6º., par. 7º., da LRF, a concessão da recuperação judicial não suspende a execução fiscal, autorizando o credor tributário a pleitear a satisfação do seu crédito pelas vias próprias. Ocorre que o STJ tem decidido que medidas de constrição patrimonial na execução fiscal, que impeçam o cumprimento do plano, devem ser afastadas pelo Poder Judiciário, em homenagem à preservação da empresa. O efeito prático disso é que os créditos tributários não são satisfeitos pela via do parcelamento especial nem pela via da execução fiscal, enquanto os créditos privados contemplados no plano são pagos. Devem ser compatibilizados os interesses de todos os envolvidos na situação de crise: o devedor deve ter seu direito à recuperação assegurado, mas os credores também precisam ser satisfeitos, incluindo o Fisco. Não será mais possível dispensar-se o devedor de adotar alguma medida de saneamento fiscal, de modo que no momento oportuno deverá ser apresentada CND ou a adesão a parcelamento previsto em lei. 7 – De acordo com autorizada doutrina, “(…) a atuação do administrador judicial não beneficia apenas os credores, mas o bom andamento do processo e todos os demais interessados no sucesso do devedor. As informações por ele angariadas e propagadas por meio dos relatórios que deve apresentar em juízo permitem que um amplo rol de agentes fique ciente das condições do devedor…a fiscalização exercida pelo administrador judicial pode resultar na indicação de descumprimento de deveres fiduciários por parte do devedor e de prejuízo a diferentes stakeholders.” (CEREZETTI, Sheila. A Recuperação Judicial de Sociedades por ações, Malheiros, 2012, pp. 280/282). Por isso, especial atenção deverá ser dedicada à fiscalização das atividades das recuperandas, o que também se estende ao período anterior à data do pedido, a fim de se apurar eventual conduta dos sócios e administradores que possam, culposa ou dolosamente, ter contribuído para a crise. 7.1. Todos os relatórios mensais das atividades da recuperanda deverão ser apresentados nestes autos, para acesso mais fácil pelos credores, sem necessidade de consulta a incidentes. O primeiro relatório mensal deverá ser apresentado em 15 dias. 8 – Arbitro a remuneração mensal da administradora judicial em R$ 100.000,00 até a data da assembleia geral de credores, observando que este juízo considera que nesta fase do processo se concentram as atividades mais relevantes da administração judicial, como a verificação dos créditos, reuniões com as recuperandas e credores, análise aprofundada dos aspectos jurídicos e econômicos do plano de recuperação, prestação de informações aos credores, e realização da assembleia geral de credores. 9 – Expeça-se edital, na forma do § 1º do artigo 52 da Lei 11.101/2005, com o prazo de 15 dias para habilitações ou divergências, que deverão ser apresentadas ao administrador judicial, no seu endereço acima mencionado, ou por meio do endereço eletrônico ajcomunicacao@deloitte.com, que deverá constar do edital. Concedo prazo de 48 horas para as recuperandas apresentarem a minuta do edital, em arquivo eletrônico. 9.1 – Caberá à serventia calcular o valor a ser recolhido para publicação do edital, intimando por telefone o advogado das recuperandas, para recolhimento em 24 horas, bem como para providenciar a publicação do edital, em jornal de grande circulação na mesma data em que publicado em órgão oficial. 9.2- Nas correspondências enviadas aos credores, deverá o administrador judicial solicitar a indicação de conta bancária, destinada ao recebimento de valores que forem assumidos como devidos nos termos do plano de recuperação, caso aprovado, evitando-se, assim, a realização de pagamentos por meio de depósito em conta judicial. 10 – Segundo Francisco Satiro, o procedimento de recuperação é necessário para neutralizar os conflitos de interesses que surgem em uma situação de insolvência. A realidade mostra que, especialmente diante da complexidade estrutural das atividades empresariais atuais e da multiplicidade de credores com interesses e objetivos no mais das vezes incompatíveis, a tarefa de negociação e composição de débitos, ou mesmo de restruturação de negócios, tende a ser inefetiva, quando não impossível. Identificou-se assim a necessidade de, ao lado do imprescindível procedimento de liquidação dos agentes financeira ou economicamente inviáveis (representado pela falência), oferecer-se ao empresário em dificuldades ferramentas que reduzissem os custos de transação, desestimulassem comportamentos oportunistas e organizassem de uma forma minimamente racional as ações dos seus credores, do modo a possibilitar um coordenado processo de negociação e decisão (Castro, Rodrigo Rocha Monteiro de; Warde Júnior, Walfrido Jorge; Guerreiro, Carolina dias Tavares (coord.). Direito Empresarial e Outros Estudos em Homenagem ao Professor José Alexandre Tavares Guerreiro. São Paulo: Quartier Latin, 2013, Capítulo 5, Autonomia dos Credores na Aprovação do Plano de Recuperação judicial; pp. 102/104). Para que o processo seja eficiente, é necessário que desde o início do procedimento os credores sejam impedidos de prosseguir nas suas execuções individuais. De acordo com Eduardo Secchi Munhoz, a suspensão das ações e execuções contra o devedor tem como finalidade principal interromper a corrida individual dos credores, evitando a liquidação precipitada de bens integrantes do patrimônio do devedor, até que sejam reunidos e classificados os diversos credores e seja apresentado um plano de recuperação (Cessão fiduciária de direitos de crédito e recuperação judicial de empresa. Revista do Advogado. AASP. Ano XXIX, setembro de 2009, nº 105, setembro de 2009, p. 115-128.). Na visão do mesmo professor, duas outras medidas são necessárias para o procedimento de negociação ser eficiente: divisão dos credores em classes e deliberação pro maioria. A reunião de credores em classes visa a assegurar que a vontade dos credores na recuperação seja manifestada de forma coerente com as características e prerrogativas contratuais de cada crédito, evitando-se, com isso, desvios de ordem hierárquica dos créditos e, portanto, soluções que acarretem o pagamento de credores de hierarquia inferior em detrimento de credores de hierarquia superior. Já o princípio majoritário dentro de cada classe é imprescindível para evitar situações de hold up, nas quais algum credor, por conta de uma situação particular, poderia, isoladamente e contra a vontade da maioria, impedir uma solução avaliada melhor para todos. A regra da unanimidade, nesse aspecto, seria deletéria, pois conferiria a credores determinados o poder de isoladamente impedir eventual recuperação. Novamente recorrendo às palavras de Francisco Satiro, a razão do arcabouço processual da recuperação judicial é a superação dos obstáculos representados pela livre negociação simultânea com vários credores, cada um deles buscando a satisfação egoística de seus interesses. O processo de recuperação judicial é, na verdade, simplesmente um meio, uma ferramenta de construção de uma solução negociada entre o devedor e seus credores, e, obviamente, de preservação das premissas contratadas. Isso significa que o plano de recuperação judicial, não obstante construído no âmbito de um processo judicial, tem natureza de negócio jurídico celebrado entre devedor e seus credores. O caráter contratual do plano se reafirma quando, após o encerramento do processo de recuperação judicial (art. 63), eliminado o conteúdo processual a própria LRF em seu art. 62 estabelece que as obrigações dele decorrentes serão tratadas como obrigações contratuais comuns, e possibilitarão aos seus titulares execução específica ou até mesmo pedido de falência do devedor com base no art. 94. Não há incompatibilidade entre o modelo de negociação entre devedor e credores, para superação da crise e preservação da empresa, e o modelo agora adotado para o direito processual, que admite negociação sobre forma dos atos, prazos para a realização dos atos e alteração de certos atos do procedimento, desde que não haja supressão de atos essenciais do procedimento. Dispõe o Art. 190 do novo Código de Processo Civil: “Versando o processo sobre direitos que admitem autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. Par. único De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.” Como já visto, a suspensão das ações e execuções individuais por 180 (“stay period”) é fundamental para que os credores não destruam o valor da organização empresarial. A divisão de credores em classes e a deliberação por maioria são fundamentais para que credores de hierarquia superior não sejam tratados de forma pior do que credores de hierarquia inferior, e para que uma minoria não impeça uma solução considerada mais satisfatória pela maioria dos credores de determinada classe. Contudo, outros atos do procedimento e a forma de realização destes atos podem ser objeto de negócio jurídico processual. Por exemplo, devedor e credores podem pactuar a forma de manifestação da vontade dos credores a respeito do plano, estabelecendo o voto escrito e não em assembleia, desde que seja possível ao administrador judicial conferir a autenticidade do voto. As partes podem ajustar nova modalidade de comunicação dos atos processuais, desde que sejam seguras, como, por exemplo, a publicação no endereço eletrônico do administrador judicial, eliminando-se as custosas publicações de editais. Também é possível que as impugnações sejam processadas extrajudicialmente pelo administrador judicial que a impugnação integralmente processada seja protocolada em juízo para decisão, poupando-se o cartório de repetidos atos de comunicação. É viável a fixação de calendário processual. Possível a eliminação ou redução do prazo de fiscalização judicial, estabelecendo as partes que o processo será encerrado com a decisão de concessão da recuperação. Neste particular, a experiência tem demonstrado que no prazo de fiscalização os relatórios são apresentados sem qualquer acompanhamento dos credores. E a permanência do devedor em estado de recuperação por dois anos gera vários entraves, quer sob o aspecto financeiro, quer sob o aspecto negocial. Além de gastos com assessores financeiros, advogados e pessoas que devem estar à disposição do administrador judicial para prestar informações sobre as atividades, o devedor tem restrição de acesso ao crédito, pois as instituições financeiras são obrigadas a adotar provisões mais conservadoras nas operações com os devedores em recuperação e os demais agentes econômicos sentem-se inseguros em contratar com quem está no regime de recuperação judicial. Ao empresário que aprovou o plano de recuperação é mais vantajoso estar livre de tais entraves, podendo dedicar-se à retomada de sua atividade e ao cumprimento do plano. Por outro lado, não haverá prejuízo aos credores, que, mesmo depois da sentença de encerramento da recuperação, a qualquer tempo poderão requerer a falência ou a execução do título, em caso de descumprimento das obrigações. À fase inicial do processo de recuperação, que consiste na negociação e deliberação sobre o plano, é que deve ser dada máxima importância. É preciso deixar às partes que promovam a negociação das obrigações e a sua fiscalização de acordo com os seus interesses. E como os negócios jurídicos processuais são compatíveis com o procedimento de recuperação judicial e podem contribuir para que ele se torne um instrumento mais eficiente para a superação da crise econômico-financeira do empresário, desde logo autorizo o administrador judicial a convocar assembleia geral destinada à deliberação sobre os temas acima mencionados e outros que porventura reputar adequados à eficiência do processo, como a constituição do Comitê de Credores, aproveitando a oportunidade de expedição de carta aos credores para dar-lhes ciência da data do conclave. 11 – A despeito do entendimento que vinha sendo adotado neste juízo, houve recente decisão do STJ, no Resp. 1.699.528, em sentido oposto, de modo que as razões expostas naquele julgado são adotadas e, para que não haja insegurança jurídica, serão contados os prazos processuais em dias corridos. 12 – Comuniquem as recuperandas a presente decisão às Fazendas Públicas da União, dos Estados e Municípios, e às Juntas Comerciais, onde têm estabelecimentos, apresentando, para esse fim, cópia desta decisão, assinada digitalmente, comprovando nos autos o protocolo em 10 dias. 13 – Intime-se o Ministério Público. 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